Doce Caveira





24 de fevereiro. Segunda-feira. 8:05 da madrugada.
- Ricardo! É a Lívia Brasão! Quer falar com você! É sobre os carros arrolados!
- Lívia Brasão? Nesse horário? Só pode ser osso! Alguma coisa deu ruim no processo dos carros! De novo...
- Atende, Ricardo! De repente é notícia boa...
- Bom dia, Lívia! Tudo...
- Saiu a autorização pro recolhimento das viaturas de vocês!
- Fala sério! Não tô acreditando que...
- Pátio Limeira! Posso confirmar?
- Opa, parou! Parou tudo, Lívia! Calma! Muita calma nessa hora! Qual a data da entrega?
- Até o dia 25 de abril! Posso confirmar?
- E pra levar os carros até lá? São quatro! Cê sabe, né?
- Contrata um guincho que transporte quatro veículos! Posso confirmar?
- Vai ter recurso pra isso? São 500 quilômetros de Prudente a Limeira! Cê sabe, né?
- A gente dá um jeito! Posso confirmar? Preciso de uma posição pra fechar com a Diretoria de Mobilidade Interna! Pra agora! É pegar ou largar...
- Confirma, Lívia! Pode confirmar!
O Ricardo nem falou pra Lívia que tava com cirurgia marcada pro dia 27 de março e que precisaria ficar em repouso absoluto por 45 dias pra começar a fisioterapia. Tava com o tendão sub-escapular do ombro esquerdo rompido desde janeiro.
E abraçadinho, só 24 horas por dia, com aquela dorzinha típica de fio esgarçado do tal do manguito rotador que, dependendo do movimento, faz o cidadão ver as estrelas, a lua, o sol, os planetas, os cometas, as nebulosas e a galáxia inteira!
O Ricardo nem falou pra Lívia que não ia ter como viajar pra Limeira pra fazer a entrega dos carros até o final de abril porque só poderia voltar a trabalhar na segunda quinzena de maio!
Mas também não tinha como deixar passar a chance de finalizar um processo que já se arrastava por sete longos anos!
Pois é!
O arrolamento dos veículos oficiais do Departamento Regional de Saúde de Presidente Prudente já tinha soprado sete velinhas!
Pensa num processo que rodou! Um vai-e-vem sem fim! Só que não avançava! Sempre voltando pra refazer os Laudos de Arrolamento! Sempre voltando pra atualizar as fotos! Sempre voltando pra alterar a denominação do órgão competente!
Era Grupo Central de Transportes Internos e mudou pra Departamento Central de Transportes Internos? Retornem os autos à origem para as devidas adequações...
Criaram um tal de um Laudo de Pré-Avaliação de Veículos? Retornem os autos à origem para juntada da nova documentação...
Renomearam pra Diretoria de Mobilidade Interna? Retornem os autos à origem para substituição das planilhas...
E lá se foram sete primaveras!
Então o Ricardo não podia abrir mão, de jeito nenhum, de acabar de vez com essa novela! Apesar de não poder participar do último capítulo!
- Ah, alguém vai ter que ir lá! Vai saber quando é que vai pintar outra oportunidade de abertura de vaga em pátio pra entregar esses carros? E também não posso desmarcar minha cirurgia! De jeito nenhum! 
O Ricardo não desmarcou a cirurgia! Mas o tal do destino...
Ah, destino!
Três dias depois - quinta feira de Carnaval - o Ricardo precisou ser levado pro hospital porque não tava conseguindo nem ficar em pé: Dengue!
Passou as três semanas seguintes bem mais ou menos! Todo santo dia tinha um apagão no sistema operacional do Ricardo! Uma queda repentina de energia, como se a carga da bateria zerasse do nada...
E aí entrou em cena o tal do trabalho de equipe! A Elisiane abriu e instruiu o processo de contratação do guincho, a Jumara fez o corre pra conseguir os orçamentos e a Tânia assumiu as tratativas com a empresa vencedora: Anjo Azul!
Pois é!
Os veículos oficiais do DRS XI, depois de sete anos de espera, seriam levados, por um Anjo Azul, pra finalmente poderem descansar em paz, no Pátio Limeira.
É o puro creme da coisa mandada, né?
Só tava faltando mesmo aquele um por cento pra tudo ficar bem encaminhado de vez: definir quem viajaria pra acompanhar o recolhimento dos carros lá no Pátio Limeira.
E aí o tal do destino tratou de resolver!
Ah, destino...
Quando o Ricardo tava quase totalmente recuperado dos estragos da Dengue, veio a Influenza! Testou positivo dois dias antes da cirurgia! Febre de 39, tosse carregada, garganta queimando que parecia que o Ricardo tinha engolido uma brasa incandescente, pulmões mais congestionados que a Marginal em dia de chuva, às seis da tarde!
- Vâmo tratar como Influenza, mas vou entrar com antibiótico também, porque pelos sintomas tem uma infecção oportunista aí que pode até evoluir pra uma pneumonia! 
Pois é! 
Cirurgia cancelada! Adiada por tempo indeterminado, pro Ricardo poder recuperar o sistema imunológico...
Pois é!
- Bora pra Limeira, entregar os carros no Pátio! Que o tal do destino é que tá mandando...
E lá foi o Ricardo pra Limeira, achando que o tal do destino já tinha fechado sua cota nessa história...
Só que não!
Foi só lá em Limeira que o Ricardo entendeu que o tal do destino tinha aprontado tudo e mais tudo pra levar ele até lá porque lá é que tinha uma história maneira pra ser contada!
Pois é!
Fazendo o check-in no hotel, o Ricardo sempre aproveita pra pedir pro pessoal da recepção dar a dica de um lugar bacana pra jantar ali por perto...
Ah, não tem posto de informação melhor que recepção de hotel pra indicar os melhores restaurantes da redondeza! Nunca falha!
- Olha, Seu Ricardo! Tem um bistrô aqui mesmo na avenida - só dois quarteirões - que é tudo de bom!
- Bistrô? Será que vira? Bistrô! Só de falar, já vem a ideia de ser coisa cara...
- Não é caro, não! Pode acreditar! Pela qualidade de tudo o que eles servem, o preço é bem justo!
- E pela quantidade? Porque bistrô também tem aquela coisa de sempre ser aquela porçãozinha que ocupa vinte por cento do prato e dez por cento do estômago, né?
- Não é pouco, não! Pode acreditar! O senhor vai sair de lá plenamente satisfeito! E a sobremesa, então? Não pode deixar de saborear...
- Bom, vou botar uma fé então! Bora lá...
- Ah, o senhor vai ver! Não é um bistrô comum! É diferente!
Aí o Ricardo interessou pra valer.
- Diferente, é? Agora que vou mesmo!
O Ricardo nem precisou entrar pra comprovar que o estabelecimento era bem fora da curva mesmo!
- Rapaz! É diferente mesmo! Muito, mas muito diferente mesmo!
Vai vendo a fachada...


Impossível não reparar no nome e no logo, né?
Caveira Doce!
Muito, mas muito fora da casinha mesmo!
- Ah, vá! Quem batizaria um bistrô com um nome desses?
Bem que a moça da recepção falou que o negócio era diferente mesmo...
Olha aí o tal do destino colocando mais uma no colo do Ricardo!
- Opa, parece que tem uma história aqui que merece ser contada!
Entrou...
Pensa num lugar maneiro! Diferente e diferenciado...




Pensa num atendimento impecável!
A moça explicou que no almoço é servida comida do dia-a-dia, mas à noite só rola a pasta, com aqueles acompanhamentos... 
É que os pratos são metade massa e metade proteína.
A gente pode escolher entre penne, fettuccine e nhoque de batata. 
E tem os risotos também...
Pensa num cardápio de fazer o cidadão salivar só de ver as fotos dos pratos!
O Ricardo tava num verdadeiro trevo! Tava era num entroncamento! Difícil demais escolher...
Ao fim de uma longa e disputadíssima seleção, restaram dois finalistas: a Pasta Parmegiana (massa penne, fettuccine ou nhoque de batata, molho pomodoro preparado na casa com tomate italiano, manjericão e parmesão com parmegiana de frango) e a Pasta Mignon Provolone (massa penne, fettuccine ou nhoque de batata, molho branco com provolone, filé mignon em cubos e provolone).
E o Ricardo acabou ficando com a primeira! O manjericão foi decisivo! É que o Ricardo gosta muito, mas muito mesmo de manjericão! O Ricardo gosta demais de manjericão!
E não se arrependeu!
Olha o naipe do prato...



Ah, pensa numa delícia! Ingredientes de altíssima qualidade, massa no ponto, temperos harmoniosos, preparo primoroso!
- Bem que a moça do hotel falou que a gente fica plenamente satisfeito...
O Ricardo nem pediu a sobremesa! Não tava cabendo mais nada no tanque!
Fez questão de registrar as devidas congratulações e os merecidos enaltecimentos na hora de pagar a conta...
- Fala pro proprietário, por gentileza, que esse lugar é tudo e mais tudo de bom e pro pessoal da cozinha que eles são verdadeiros artistas da gastronomia e as obras que eles produzem são espetaculares! 
- Ah, a gente agradece de coração! E, se o senhor quiser, pode falar diretamente com o dono, o Fernando! Ele tá ali na última mesa, pertinho de onde o senhor estava...
E lá foi o Ricardo rasgar tudo e mais tudo que é elogio pro feliz proprietário do bistrô.
- Rapaz, que lugar fantástico! Gostei demais! Energia muito boa, comida maravilhosa, preço justo! 
- Ah, a gente agradece de coração...
- Agora me fala uma coisa: de onde veio a Caveira Doce?
- É que a gente simplesmente quis ser diferente! No começo, era só confeitaria! Então a gente pensou em um nome e uma marca totalmente fora dos padrões do ramo! Com um nome comum e um bolinho colorido no logo, a gente seria só mais uma doceria! Já com a caveira...
- Caramba! E conseguiram, viu? Porque a sensação quando a gente vê o desenho é realmente impactante! Ninguém espera ver uma caveira como marca de um restaurante...
- Só que a nossa também não é uma caveira comum! Reparou que tem vida nela? A gente fez questão de colocar no crânio as matérias primas essenciais da nossa culinária: as flores nos olhos são da Theobroma Cacao, a árvore que produz o cacau; na testa, tem uma folha de menta; no queixo, tem a ponta de uma blueberry; o bigode é de favas de baunilha e, pra fechar, o Toque Blanc, o famoso chapéu de cozinheiro...
- Caveira Doce! Sensacional! 



Aí o Fernando contou que eles ganharam projeção nacional quando participaram do Programa Que seja doce, da GNT! E fizeram bonito! Ganharam a competição!
Aí o Ricardo contou pro Fernando que gosta de escrever, que tem um blog, que publica toda sexta e que também tenta criar um estilo próprio, dar uma marca pessoal pros textos dele...
- Se não for pra ser diferente, melhor nem fazer!
E, de repente, veio a iluminação!
- Tô com uma ideia aqui, Fernando! Gosto de escrever de um jeito diferente e você tem um bistrô que também é muito, mas muito diferente mesmo de tudo e mais tudo que é confeitaria e restaurante junto e misturado que alguém possa imaginar! Posso escrever sobre vocês? Posso ter a honra de levar a Sweet Skull pro Sextou, Textou!?
Advinha só se o Fernando topou. E ainda deixou a porta aberta.
- Quando voltar, faço questão que você prove a Pasta Mignon Provolone...
Pronto, Fernando! Já é!
O complicado vai ser voltar a Limeira! Se bem que tem um Palio 2008 na frota do DRS XI que tá bem mais ou menos, bem cansadinho, já tá fazendo jus à aposentadoria...
- Bora arrolar! 

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