Ô! O Campeão voltou! O Campeão voltou! O Campeão voltou, ÔÔÔÔÔÔÔ!



A história de torcedor de futebol do Ricardo começou alvi-negra. Pois é! Corintiano! Misericórdia, que heresia começar uma crônica dedicada ao São Paulo citando o maior rival!

Mas se é pra contar tudo bem direitinho, do jeito que aconteceu mesmo, a gente tem que fazer o sacrifício...

É aquela coisa de doutrinar a criança pequena que não entende nada de nada, quanto mais de futebol. Aí quem tem a moral de ensinar mais rápido o coitadinho a repetir o nome do seu time ganha mais um adepto. 

E logo já compra camiseta, calção, boné, uniforme completo. E tudo e mais tudo! Presente, então, nem se fala! Nos primeiros dois anos de vida tudo que o inocente ganha tem que ter o distintivo do clube. Pelo menos as cores!

Com o Ricardo não foi diferente. Foi o avô quem venceu a corrida. Trajou o moleque de preto-e-branco e carimbou a inscrição pro bando de loucos.

O pior é que o vô do Ricardo não confessava sua paixão pelo Timão de jeito nenhum! Falava que gostava era da Portuguesa! Corintiano enrustido, pode um negócio desse? Alguém por acaso conhece alguém assim?

Bom, bora falar de time grande, né? Daqueles que não tem título de Série B na sua galeria!

E de como o Ricardo nem chegou a sentir na pele o que é ser sofredor....

A virada de casaca foi quando nasceu a irmã dele. A Patrícia queimou a largada, veio prematura, com 1,750 kg. Precisou ficar uns dias na incubadora.

E a mãe precisou ficar o tempo todo junto. E a vó também colou lá no hospital, pra ajudar e fazer companhia...

Daí que não sobrou ninguém pra tomar conta do Ricardo. O jeito foi terceirizar o menino: acabou indo pra casa da Tia Branca, pra ficar sob os cuidados da Tina, a prima que já era adolescente.

Foi ela que fez o Ricardo virar tricolor! Prometeu pra ele um dominó do São Paulo se abandonasse o Corinthians. E ele topou na hora! Se vendeu fácil, fácil! Corrupção ativa e passiva escancarada...

Mas a real é que o Ricardo só acabou escolhendo mesmo pra quem ia torcer quando começou a conhecer o futebol, quando começou a jogar bola com a molecada na rua, depois no campinho, uma faixa estreita de terra entre a linha do trem e a atual Avenida José Claro.

Jogo raiz! Todo mundo saía ralado por causa das britas da estrada de ferro. E quando chovia: o puro creme do lamaçal! Era demais! E só acabava quando anoitecia e ninguém mais conseguia ver a bola...

Mais pra frente começou a assistir os jogos e a comparar os times. Bom, não era tanto assistir, porque na década de oitenta quase não passava futebol na TV, acredita?

Quem já entrou na casa dos "enta" sabe bem como era: só tinha sinal aberto e nenhuma emissora passava jogo na quarta à noite e, pasmem, nem no domingo!

Só a Bandeirantes mostrava uma partida da rodada do Paulistão, no sábado à tarde e a Cultura também podia transmitir os jogos no Estado de São Paulo, sem pagar nada pra clube nenhum, por ser canal do governo.

Mas também não fazia muita questão de usufruir do direito porque futebol não dava audiência! Parece mentira, né?

Então, pra acompanhar ao vivo os clássicos, as decisões, os jogos mais importantes e mais emocionantes, a solução era colar o ouvido no radinho! De pilha...

Só que não! O vô do Ricardo - aquele mesmo, o corintiano disfarçado de fã da Lusa - tinha um aparelho top das galáxias! Pegava até ondas curtas e tudo que é emissora: do Brasil, Estados Unidos, Inglaterra, Alemanha, França, Itália, Portugal, Espanha! O Ricardo gostava de ficar zapeando as estações pra tentar aprender alguma coisa dos idiomas...

Mas domingo à tarde a sintonia era religiosa: Rádio Bandeirantes! Fiori Gigliotti, o locutor da torcida brasileira!

- Abrem-se as cortinas e começa o espetáculo!

- O tempo passa, torcida brasileira!

- Uma beleeeeeeza de gol!

- Aguenta, coração!

- Agora não adianta chorar!

- Crepúsculo de jogo!

E o Ricardo e o vô sentados ao lado do rádio, acompanhando a narração rápida, intensa, escorreita, português impecável. 

Vibrava com a torcida do time que tava ganhando e sofria com quem tava perdendo. O cara exercitava a empatia com os dois lados!

E, falando, pintava um cenário dinâmico, com o movimento do vai-e-vem dos jogadores, com a trilha sonora das torcidas - sim, no plural, podia sim assistir jogo no campo do adversário - que fazia a gente experimentar a sensação de estar lá, vendo tudo, cada lance. Perfeito!

E foi numa dessas que o Ricardo entregou o coraçãozinho pro Mais Querido!

Final do Campeonato Paulista de 1985. Justo contra a Portuguesa, o time postiço do vô corintiano!

O técnico do São Paulo, Cilinho, era da turma do "vâmo jogar pra fazer gol!"

- Se levar três, a gente faz cinco!

Deixou o Falcão, o Rei de Roma, de castigo no banco e colocou pra jogar a molecada que tava vindo da base: os Menudos do Morumbi!

Foi um passeio: 3x1! E olha que a Portuguesa tinha um baita time...

À noite a gente via os gols no Fantástico. Tinha que ficar acordado porque era o último quadro do programa. Ah, mas naquele domingo o Ricardo não pregou o olho! E assim nasceu a paixão pelo Time da Fé!

Que só fez crescer daí em diante!

No ano seguinte veio o título do Brasileirão: uma final épica contra o Guarani, em Campinas.

Os caras tinham um timaço! O Ricardo bate o pé que foi o jogo mais eletrizante que ele viu na vida!

O tempo normal acabou um a um e a prorrogação foi fogo no parquinho total! Trocação no mais alto grau de pureza! Quatro gols! Dois a dois! Com um gol de empate do São Paulo no último lance! Careca! Uma bomba de sem-pulo!

E, pra levar a adrenalina pra estratosfera, vitória nos pênaltis!

Ah, São Paulo, seu lindo!

Em 91 começou a fase mais gloriosa da história do clube, com a chegada do Mestre: Telê Santana!

Chamado de pé-frio por ter sido o treinador da seleção que não ganhou as Copas de 82 e 86, comandou o São Paulo em conquistas que nem os mais fanáticos torcedores ousavam imaginar: o bicampeonato da Libertadores e o bi do Mundial Interclubes, em jogos espetaculares contra nada mais, nada menos que os poderosíssimos Barcelona e Milan!

E o Ricardo documentou tudinho!

O avô dele assinava o Estadão e o Ricardo começou a recortar as notícias do São Paulo desde a primeira Liberta, a de 92. Montou uma pasta, um dossiê dos bastidores, treinamentos, jogos e comemorações.

E como deu bom, continuou a colecionar as notícias do jornal na temporada seguinte. E guardou os registros! Por trinta anos!

Bora dar uma olhada?



LIBERTADORES DA AMÉRICA - 1992





MUNDIAL INTERCLUBES - 1992





CAMPEONATO PAULISTA - 1993





LIBERTADORES DA AMÉRICA - 1993






SUPERCOPA - 1993





MUNDIAL INTERCLUBES - 1993




Pois é! Isso tudo há trinta anos! Meio que bem difícil de se igualar, né? Tão no corre até hoje...

E ainda teve mais!

A partir de 2005, um novo ciclo monstruoso! Campeão Paulista, da América e Mundial!

O jogo do Mundial foi, digamos, diferentão pro Ricardo. Tava na praia. Mas não assistiu no apartamento de frente pro mar, não! Nem no quiosque ali no calçadão! O Ricardo acompanhou a decisão contra o Liverpool na Unidade Básica de Saúde de Matinhos...

É que a Dona Marina, a mãe dele, passava mal toda vez que ia pra praia. Ela adorava viajar pra praia - escrevia na areia igual ao Padre Anchieta pra agradecer a Deus por poder ver o mar - mas não tinha uma vez que o fígado não azedava. Levava os Epocler da vida, mas não tinha jeito: só sarava quando tomava medicação na veia.

E, naquele ano, justo no dia da final do Mundial, Dona Marina amanheceu de rosca...

- Bora lá pro postinho, Dona Marina!

E o Ricardo foi rezando pra ter uma televisão na UBS. E não é que tinha mesmo?

- Oh, glória!

Que nada! Melhor seria não ter assistido! O São Paulo fez o gol no comecinho - Mineiro, aos cinco minutos - e passou os outros oitenta e cinco na retranca, tomando a maior pressão dos ingleses! Segurando tudo e mais tudo!

Até que rolou a fatídica cobrança de falta!  No finalzinho! Gerrard, o craque dos caras! Foi na gaveta! Indefensável!

Só que não! O Rogério Ceni, sabe-se lá como, conseguiu dar um tapinha na bola! Tirou de lá de dentro!

Aí o Ricardo desmontou: subiu a pressão, passou mal, precisou tomar um negocinho na veia também...

- Ricardo, do que?

- Sestim! Ricardo Sestim!

- Ainda bem que já tava aqui, né Seu Ricardo!

- Ainda bem que o São Paulo é tri-mundial, meu querido!

E, em 2006, teve início mais uma trilogia: a do Brasileirão! Outro desafio pros rivais tentarem repetir! Sob o comando do incansável Muricy Ramalho!

- Aqui é trabalho, meu filho!

Mas como tudo nesse mundo é cíclico, o tempo da alegria deu lugar à fase da seca, do jejum de conquistas, das decepções seguidas. Teve ano que o São Paulo jogou pra não cair pra Segunda Divisão! Que vergonha! 

Vá lá que teve a Sul-Americana de 2012! Mas vâmo combinar? Bem mais ou menos...

E depois, nada! Dez anos sem ganhar nada! Fala sério! Pra quem tava acostumado a estabelecer recordes inalcançáveis! Pra quem só via os adversários pelo retrovisor! Ah, que deserto sem fim!

Mas, quando menos se espera, aparece um oásis pra quem acha que não vai completar a travessia!

Copa do Brasil de 2023!

Palmeiras, Corinthians, Flamengo: os três maiores rivais! Os três no caminho do título! Inédito! A única taça que faltava na prateleira!

Só precisava ganhar do Campeão de Tudo, do Campeão dos Campeões e do Campeão das Multidões!

E não é que ganhou dos três?

O São Paulo foi Palmeiras contra o Palmeiras: pragmático, frio, cirúrgico!

Foi Corinthians contra o Corinthians: garra, entrega, coração!

Foi Flamengo contra o Flamengo: técnico, tático, completo!

E nenhum dos três conseguiu ser São Paulo contra o São Paulo!

Porque Soberano é um só!


Comentários

  1. E viva o São Paulo. Chupa que é de uva kkk. Bjs 👏👏👏

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  2. O São Paulo, foi o maior time formador de craques que eu conheci.

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