Melhor que lasanha!
- Aff, Mano! Oito grau! Tá frio pra caramba!
- Pior! Tava mó escuro quando acordei!
- Foi osso pra sair da cama, hein?
- Só vim porque o Projeto é da hora, Brô!
- Fala sério, Lasanha! Só veio pra comer, né Passa-Mal!
Antes de virar o Lasanha, o apelido do menino era Fedô. Pagava uma de Cascão, ia pra escola sem tomar banho um, dois, três dias seguidos, a semana inteira na real. Entrava na sala e já "impestiava" o ambiente...
Já tava adolescente quando começou a frequentar o Criança Cidadã, o asseio já tava em dia - graças a Deus - mas todo mundo continuava chamando ele de Fedô. É daqueles que fica pra sempre, igual tatuagem.
Ou não! Pode acontecer - é raro, mas vez ou outra rola - de uma nova marca superar o grau de identificação da anterior.
O processo começou no primeiro almoço do rapaz no Projeto. O menu era o de sempre - arroz com carne moída e salada de alface e tomate - mas muito bem preparado pela Zelma.
- Irmão, que tempero é esse? Isso tá muito bom! Tá excelente! Tá gostoso demais! É melhor que lasanha, tio!
E todo santo dia o moleque repetia que a comida tava melhor que lasanha. Arroz com carne moída, macarrão com salsicha, arroz com salsicha, macarrão com carne moída: o maluco comia, repetia e fazia questão de reiterar o bordão.
- Melhor que lasanha!
Até que um belo dia o Tá Ligado perdeu a linha.
- Qual é, Fedô? Todo dia você fala que o rango tá melhor que lasanha, mano! Tá variando, exprimão? Quem no mundo acha que carne moída e "salchicha" é melhor que lasanha? Você viaja demais, tá ligado?
- Pois é, mano! Então, fala aí: essa lasanha aí no seu prato tá gostosa, tio?
- Que mané, lasanha? Pirou, Fedô? Num tem lasanha nenhuma aqui, ô maluco!
- Então o que você tá comendo aí com certeza tá melhor que lasanha, num tá não? Pra mim sempre tá...
E o refeitório inteiro, que tava acompanhando o debate como se tivesse assistindo a uma treta de segunda-feira do Big Brother, desabou em gargalhada. E a partir desse dia, o Fedô virou o Lasanha...
- O rango aqui é top mesmo, vou negar não! Mas as parada de céu que o Professor tá ensinando também é firmeza!
- Rapaz, uma declaração dessas do Lasanha é o melhor elogio que um Educador pode receber. Colocar astronomia na mesma prateleira do almoço da Zelma é uma baita conquista pra mim! Já ganhei o dia, galera!
- Então, Professor! Tá um frio danado!
- Tá todo mundo congelando aqui dentro da sala!
- Todo mundo com a mão doendo pra escrever!
- Bora pegar um sol lá fora, bater uma bola pra esquentar a máquina, mano?
- Vâmo sim! Daqui a pouco, depois de terminar a atividade planejada pra hoje.
- Fala sério, Professor! Meu cérebro nem tá dando partida...
- Por que é que tem essa parada de fazer frio todo ano, hein?
- Paz no coração, pessoal! Lá fora tá bem pior que aqui dentro. O vento tá balançando as árvores, sensação térmica deve estar em zero grau. E hoje ninguém vai escrever: vâmo trabalhar só com imagens...
- E o assunto tem tudo a ver: como já tâmo bem próximos do solstício de inverno, hoje a gente vai estudar as estações do ano! E sua pergunta será respondida, Berenice!
- Também vai desenrolar o lance de fazer calor todo ano?
- Pacote completo!
- E aí, mais tarde, quando o sol tiver mais alto, a gente sai pra ficar igual calango no muro, né Professor?
- O sol, pessoal! É o principal personagem do fenômeno das estações do ano. Pra começar, alguém aí tem ideia de como acontece? Por que no decorrer do ano temos um período de calor e um período de frio?
- Moleza, Professor! Você já cantou que o sol é o cara do sistema todo! Então é o seguinte: a Terra gira em torno do Sol. Isso você já ensinou quando tava falando das constelação dos signo.
- Constelações Zodiacais...
- Essa fita mesmo aí! E deu maior conversa, todo mundo pegou ar quando descobriu que tava lendo os horóscopo errado, lembra?
(Pra quem ficou curioso, só dar uma conferida no texto "O coração do escorpião", aqui mesmo no blog).
- Daí que nesse rolê a Terra fica mais perto do sol numas época e mais longe do sol noutras época, porque esse caminho não é um círculo perfeito, é meio que oval, castela?
- Realmente, a órbita da Terra é elíptica...
- Então quando a Terra passa mais perto do sol, fica mais quente e quando passa mais longe fica mais frio...
- Matou a pau, Presidente!
- PQP, moleque ligeiro, mano!
- Sabe demais, parça!
- Aprende com o pai, meus cria!
- É, galera! Sinto muito, mas vou ter que tirar o docinho da boquinha de vocês! Infelizmente não é nada disso, meus queridos!
- Tá certo que o caminho que a Terra percorre em torno do sol é meio oval mesmo, Presidente, mas não é o suficiente pra provocar as variações de temperatura que caracterizam o verão e o inverno.
- E tem outra! Temos que considerar que as estações do ano são invertidas nos dois hemisférios. Quando é verão no Norte, é inverno no Sul e vice-versa. Se as estações fossem determinadas pela proximidade com o sol, elas seriam rigorosamente iguais nos dois hemisférios...
- Eita, é real!
- Que furada, brother!
- Todo mundo foi bem juvenil nessa...
- Que deselegante!
- Opa, muita calma nessa hora, pessoal! Ciência é assim mesmo: tentativa e erro são essenciais pra haver evolução...
- E pra vocês não ficarem tão bolados, olha só como os gregos explicavam as estações do ano:
"Hades, irmão de Zeus, comandava o mundo dos mortos. Mas o cara vivia na solidão, na maior deprê. Um belo dia resolveu dar um perdido na superfície pra tentar arrumar uma esposa.
Trombou logo com Perséfone e gamou de cara na mina. Pegou na hora e levou embora pro seu reino. O B.O. é que Perséfone era filha de Deméter, a deusa da agricultura e da vegetação, responsável pela fertilidade das plantações, principalmente de grãos.
Quando ficou sabendo do rapto da filha, Deméter se isolou no templo e abandonou todas as suas funções. E a terra não produzia mais nada. E a fome se espalhou pelo mundo inteiro.
Foi aí que Zeus se viu obrigado a intervir na questão. Acabou intermediando um acordo entre Hades e Deméter: Perséfone passaria metade do ano com Deméter que, feliz com a companhia da filha, garantiria a continuidade do ciclo da vida. Na outra metade do ano, Perséfone ficaria com Hades, período em que a tristeza de Deméter deixava o mundo frio, estéril.
Assim, eram seis meses de calor, alegria e fartura e seis meses de frio, desgosto e penúria."
- Então lá nos antigamente era só duas estação?
- Isso mesmo: "veris", o bom tempo e "hiems", o mau tempo. Só que a divisão não era proporcional: o "veris" durava nove meses e o "hiems" só três. Claro que havia as exceções, como dias quentes na época do mau tempo e dias frios na época do bom tempo, como ocorre todo ano comumente.
- Mas, basicamente, tudo que não estivesse compreendido no período dos três meses do "hiems", o nosso inverno, era "veris", o nosso verão.
- Só que o pessoal acabou percebendo que, em determinados períodos, o "veris" não era tão "veris" assim e acharam melhor fazer uma subdivisão pra retratar com mais fidelidade o que acontecia com o clima.
- Então fatiaram o bom tempo? Em quantas partes?
- Fatiaram! Boa definição, Perfume! Dividiram em três períodos.
"Primo Vere": o primeiro verão (o começo do tempo bom, a primavera);
"Tempus Veranus": o verão mesmo (o auge do tempo bom: os meses do calorão);
"Tempus Autumnus": o ocaso, a queda (o final do tempo bom, o outono: quando o sol começa a se esconder e os dias ficam mais frios).
- E o hiems, o tempo ruim?
- Passou a ser chamado de "Tempus Hibernus" (o inverno, tempo de hibernar, de dormir: os meses da friaca braba).
- Firmeza, Professor! Maneiro aí as divisão, os latim na elegância, mas cadê que explicou o funcionamento das estação?
- Bora lá então, Fatal!
- Santinhos e Santinhos, a Terra gira em sua órbita em torno do sol. Leva 365 dias e seis horas pra completar uma volta. Um ano. É o famoso movimento de translação, que, na verdade, tem o nome oficial de revolução no meio científico.
- Beleza, até aí a gente domina! Tâmo na ansiedade pra saber daí pra frente, Professor!
- Então lá vai! Pensem a órbita da Terra como um plano. Também tem nome: eclíptica. A razão da ocorrência das estações do ano é que a Terra tem uma inclinação de 23 graus em relação ao plano de sua órbita.
- Quer dizer que o planeta não gira em pé?
- É nada que a Terra roda de "esgueio"!
- Pois é, lindinhas e bonitões! A gente tá de "través no corre"!
- Ainda não entendi! O que é que tem a ver a Terra estar inclinada?
- Só tudo, Karolaine! Vâmo pras imagens pra iluminar as trevas.
- Posição da Terra no dia 22 de junho. Percebam que, devido à inclinação, o hemisfério norte recebe mais diretamente a luminosidade do sol do que o hemisfério sul. Nesse dia, o sol fica alinhado com o Trópico de Câncer. As regiões próximas a ele recebem a luz na perpendicular, nos noventa graus e, com isso, são mais aquecidas.
- Agora vejam como o sol ilumina o Trópico de Capricórnio nesse mesmo dia.
- Nossa! Os raio bate de lado, na diagonal!
- Por isso toda essa região fica menos aquecida!
- E temos verão no hemisfério Norte e inverno no Sul.
- Agora a Posição da Terra no dia 22 de dezembro.
- É o contrário, mano!
- Exato! Agora é o Trópico de Capricórnio que está em alinhamento com o sol, com os raios incidindo na direta.
- E o Trópico de Câncer é que tá sendo iluminado, meio que, de atravessado, Professor!
- E aí temos inverno no hemisfério Norte e verão no hemisfério Sul.
- Então é por isso que o Papai Noel tá sempre com aquelas roupa pesada...
- Mas pra vir trazer os presente pra nóis aqui do sul tinha que botar uma regata e um shortão, mano!
- Dezembrão aqui, rapá! Tinha que meter é uma sunga pra aguentar o trampo...
- Vou falar uma coisa pra vocês, turma: Educador Social ganha pouco, mas se diverte pra caramba...
- E é só nessas data aí que o sol alinha com os trópico, Professor?
- Alinhamento perfeito, só nesses dois dias, que marcam o início das estações nos dois hemisférios. Pra nós, 21 ou 22 de junho é o começo do inverno e 22 ou 23 de dezembro, o do verão. E o contrário pro pessoal lá de cima.
- Esses dias são conhecidos como solstícios, que significa "sol estacionado", justamente porque são os pontos de alinhamento mais ao norte e mais ao sul do sol com o nosso planeta.
- Então o sol nunca fica alinhado com um local acima do Trópico de Câncer nem abaixo do Trópico de Capricórnio?
- Bela dedução, Ana Laís!
- Ah, é igual uma linha de ônibus, tá ligado? Os tal dos trópico aí é os ponto final. Quando o busão chega no fim da linha, dá aquela parada pra descer todo mundo e começa a voltar no caminho...
- É, Tá Ligado! Tirando a parada, o restante da analogia tá perfeita.
- Ô, Professor! Tô filmando aqui que nessa imagem aí a Terra parece que tá usando aqueles vestido "Tomara que caia"...
- E não é que parece mesmo, Mil Grau! O Trópico de Câncer é a barra de cima do vestido e o de Capricórnio é a de baixo...
- Agora que nunca mais vou esquecer como acontece as estação do ano. Quando o sol ilumina direto nos "peitinho" da Terra, é verão no Norte e quando ilumina direto na bundinha, é verão no Sul!
- Ah, meus queridos! Vocês são sensacionais! E vou aproveitar pra embarcar nessa pra falar das outras estações: a primavera e o outono.
- As datas de início são 23 de setembro e 20 de março. Mas reparem o alinhamento do sol com a Terra nesses dias e como os hemisférios são iluminados...
- Opa, tá diferente! Parece que os dois tão sendo iluminado igual...
- E tão mesmo, Witney! Nesses dois dias o sol fica alinhado com a Linha do Equador, que divide o planeta nos dois hemisférios (as metades da esfera). São os únicos dois dias no ano em que o dia e a noite tem a mesma duração: exatamente doze horas cada um.
- Wow, mano! Que sinistro!
- Então, seguindo a premissa do "Tomara que caia", primavera e outono tem início nos dois hemisférios nos dias em que o sol fica alinhado com o "umbiguinho" da Terra!
- Agora fechou de vez! Pra ficar gravado na mente pra sempre, tio!
- Pra fechar mesmo, só quero mostrar pra vocês como as estações do ano tinham importância fundamental na vida dos povos da antiguidade: era por elas que eles estabeleciam suas rotinas de sobrevivência: plantar, colher, migrar, planejar atividades e até fazer festa, com base no conhecimento de que o clima estaria quente ou frio de acordo com a época do ano.
- Foi assim, por exemplo, que os hebreus planejaram minuciosamente a fuga do Egito. Combinaram de meter o pé na estrada na virada do outono pra primavera, pra não passar frio no caminho e esperaram a primeira lua cheia, pra ter iluminação noturna. E foram pra Páscoa, a passagem...
- E até hoje a data da Páscoa segue essa fórmula: todo ano, o Domingo de Páscoa é sempre o primeiro domingo seguinte à primeira lua cheia que ocorrer depois do dia 20 de março, o início da primavera no hemisfério Norte.
- Por isso que cada ano a Páscoa cai em data diferente...
- Então o Carnaval também...
- Perfeitamente, Fatal! Temos aqui um "movimento retrógrado" no calendário: o Carnaval é marcado voltando quarenta dias a partir do domingo anterior ao de Páscoa, o de Ramos.
- Falando em festa, Professor! Já não tá na hora da gente dar um pião lá fora, pegar uns raio de sol nem que seja na diagonal, dar uma espreguiçada daquelas...
- Galera, já tá é quase na hora do almoço...
- Caramba, perdêmo a noção do tempo aqui nas estação do ano, mano!
- Bora direto pro refeitório, que a Zelma já vai chamar...
Aí o Lasanha colou com o Educador no corredor e mandou a letra.
- Ô, Professor! Não é por nada não, mano! Você sabe o tanto que eu gosto do rango aqui do Projeto, né? Mas aí, na boa, a resenha hoje tava melhor que lasanha, falei?
- Falou, Lasanha! Valeu, moleque!
👏👏
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